Apesar do Brasil ser considerado o maior produtor e exportador de soja do mundo, o país ainda enfrenta uma série de desafios quando o assunto é o manejo integrado de doenças da soja. Conheça sete das principais doenças da soja que afetam essa cultura e como se dá o manejo delas no campo!
Quais as principais doenças da cultura da soja?
As doenças da soja são, ainda hoje, um dos principais fatores que podem implicar em grandes custos de produção para o agricultor e ainda comprometer severamente a qualidade e a produtividade das lavouras de soja.
Apesar da importância econômica das doenças da soja variar de acordo com a região produtora e as condições climáticas de cada safra, de forma geral existe um grupo de doenças de ampla ocorrência no país. Mas, quais são as principais doenças da soja?
1. A ferrugem asiática da soja
A ferrugem asiática é considerada uma das doenças mais importantes da soja, visto a sua fácil dispersão, difícil controle e potencial para causar perdas significativas de produção das lavouras, que podem chegar a até 75%.
Esse potencial destrutivo da ferrugem asiática está relacionado aos danos que o agente causador dessa doença, o fungo Phakopsora pachyrhizi, provoca nos tecidos foliares das plantas.
Isso reduz a capacidade fotossintética e, consequentemente, compromete a capacidade das plantas em converter a luz solar e os nutrientes absorvidos em energia.
Além disso, outro agravante dessa doença da soja está relacionado à sua facilidade de dispersão via correntes aéreas. Por isso, países vizinhos do Brasil, como Bolívia e Paraguai, acabam tendo grande efeito na disseminação do fungo, uma vez que eles apresentam um ciclo cultural em épocas anteriores ao do nosso país.
Por isso, desde o registro da primeira ocorrência dessa doença no Brasil em 2001, ela vem sendo extensivamente monitorada e pesquisada por um grupo de instituições públicas e privadas, chamado “Comitê de Ação à Resistência de Fungicidas – FRAC”.
De acordo com o FRAC, o controle efetivo da ferrugem asiática da soja geralmente envolve a integração de diferentes estratégias de controle, para evitar que o fungo adquira tolerância às medidas de controle. Dentre elas, estão inclusas:
- A aplicação de fungicidas, sempre revezando o princípio ativo e respeitando o período de carência;
- A semeadura da soja no início da época recomendada para a sua região;
- A realização do vazio sanitário de acordo com a sua região de produção;
- A utilização de cultivares precoces de soja e com gene(s) de tolerância.
Estudos recentes também demonstram que a aplicação de silício pode se tornar outra estratégia importante para o controle dessa doença da soja.
Isso porque esse elemento benéfico é capaz de aumentar os níveis de substâncias pigmentantes que são importantes para a fotossíntese das plantas e reduzir os efeitos dos sintomas da ferrugem asiática.
É o que observaram o Prof. Fabrício de Ávila Rodrigues e outros pesquisadores do Departamento de Fitopatologia da Universidade Federal de Viçosa, no artigo Asian Soybean Rust Control on Soybean Sprayed with a New Source of Soluble Silicon.
Estudos demonstram que a utilização do silício tem se mostrado eficaz no controle da ferrugem asiática da soja.
2. A podridão radicular de fitóftora
Identificada pela primeira vez no Brasil na década de 90, a podridão radicular de fitóftora é outra das doenças da soja com alto potencial destrutivo, podendo causar reduções de rendimento de grãos de até 100% em cultivares altamente suscetíveis.
Quando presente nas lavouras, o agente causal da podridão radicular de fitóftora, o oomiceto Phytophthora sojae, pode causar:
- O tombamento de plântulas;
- O apodrecimento de raízes de plantas adultas;
- A morte de plântulas em pré e pós-emergência;
- O escurecimento do córtex e dos tecidos vasculares;
- O apodrecimento de sementes, hastes e ramos laterais;
- O amarelecimento, murcha e secagem das folhas, que se mantêm presas à haste.
Normalmente, esse patógeno é disseminado principalmente através do solo e dos restos culturais da soja contaminados e a sua propagação pode ser potencializada por condições de solo e clima favoráveis, como solos encharcados com temperaturas iguais ou superiores a 25ºC.
Por isso, solos com alto teor de argilas, compactados e com prolongados períodos de saturação de umidade, acabam favorecendo a disseminação do patógeno nas lavouras, aumentando a intensidade da podridão radicular de fitóftora nos talhões.
A associação do uso de variedades resistentes com a aplicação de doses adequadas de fertilizantes e o manejo adequado do solo consistem nas práticas mais usualmente aplicadas para controle dessa doença da soja na lavoura.
É o que escrevem Leila Maria Costamilan e outros pesquisadores da Embrapa, no estudo Podridão radicular de fitóftora em soja.
Entretanto, eles destacam que, em plantas adultas, os danos não justificam a adoção de medidas de controle.
3. A antracnose
Assim como a podridão radicular de fitóftora, a antracnose é outra das doenças da soja que ocorre sob condições de alta umidade.
Entretanto, seus danos são direcionados às estruturas reprodutivas da soja, causando o apodrecimento ou a abertura das vagens imaturas e a germinação de grãos em formação.
Os sintomas típicos da antracnose normalmente consistem em lesões concêntricas escuras nas vagens da soja, onde se observam pontuações pretas que são as estruturas do fungo Colletotrichum truncatum. Também podem ser observadas manchas escuras no tegumento das sementes, caso já estejam infectadas.
É o que explicam Kátia de Lima Nechet e outros pesquisadores da Embrapa, no estudo Antracnose (Colletotrichum truncatum): doença importante para a soja (Glycine max) nos cerrados de Roraima.
Como a principal via de transmissão dessa doença da soja é via sementes, recomenda-se que o agricultor sempre adquira sementes sadias de empresas idôneas. Também é possível recorrer ao tratamento das sementes com fungicidas, caso haja a presença de mais de 5% de sementes infectadas nos lotes.
Complementarmente, o agricultor pode adotar as outras medidas para o controle da antracnose, como:
- Adequar a população de plantas (250.000 a 300.000 plantas/ha);
- Eliminar as plantas daninhas hospedeiras do fungo;
- Utilizar maior espaçamento entre as linhas (50-55 cm);
- Manejar adequadamente o solo;
- Fazer rotação de culturas.
Além disso, estudos indicam que lavouras sob deficiência nutricional, principalmente de potássio, aumentam a susceptibilidade das plantas de soja à ocorrência de antracnose. Portanto, a escolha de fontes e doses adequadas de potássio para a cultura, assim como de outros nutrientes, constitui-se outra importante medida de controle dessa doença da soja.
4. O mofo branco
O mofo branco, também chamado de podridão-branca-da-haste ou ainda podridão-de-Sclerotinia, é uma doença da soja que, assim como a antracnose, é introduzida nas lavouras principalmente através de sementes contaminadas.
É comum que plantas acometidas pelo mofo branco inicialmente apresentem lesões encharcadas nas áreas atacadas, que evoluem para grandes massas de micélio branco de aspecto cotonoso com a progressão da doença para as hastes e ramos da soja.
Características da doença mofo branco na soja (Fonte: Meyer, M. – Embrapa Soja, 2014)
Normalmente, o período crítico para a infecção inicia com a floração da soja, uma vez que é através das flores que o agente causal da doença, o fungo Sclerotinia sclerotiorum, penetra para o interior da planta.
E, uma vez dentro da planta, o fungo passa a se multiplicar e se espalhar para o restante da planta, quando as flores começam a cair sobre as folhas.
Como a presença do mofo branco afeta principalmente as flores da soja e posteriormente a estrutura da planta, a doença pode promover perdas de até 70% da produtividade da soja.
Por isso, o seu controle é muito importante para assegurar uma boa produtividade da cultura.
Apesar do agente causal dessa doença possuir uma ampla gama de hospedeiros, incluindo o algodão e diversas espécies de plantas daninhas, estudos indicam que a integração de medidas de controle cultural, químico e biológico tem mostrado resultados positivos no campo.
Dentre elas, podemos destacar:
- A escolha de cultivares com arquitetura que favoreça a boa aeração entre as plantas e com período mais curto de florescimento;
- A população de plantas e espaçamento entrelinhas adequadas às cultivares;
- O uso do sistema de semeadura direta sobre palha de gramíneas;
- A utilização de sementes de boa qualidade sanitária e fisiológica;
- A pulverização foliar de fungicidas e o tratamento de sementes;
- A rotação e/ou sucessão com culturas não hospedeiras;
- A inoculação de inimigos naturais do fungo.
É o que recomendam Maurício Conrado Meyer e outros pesquisadores, no artigo Eficiência de fungicidas para controle de mofo-branco (Sclerotinia sclerotiorum) em soja, na safra 2019/2020: resultados sumarizados dos experimentos cooperativos
5. A mancha-alvo
A mancha-alvo também é considerada uma doença de grande importância para a soja, assim como outras culturas, uma vez que ela causa desfolhas que podem chegar a afetar até 40% da produtividade das lavouras com cultivares de soja suscetíveis.
O agente causal da doença, o fungo Corynespora cassicola, é reconhecido por infectar mais de 400 espécies de plantas, incluindo o algodão, o feijão, a crotalária e diversas plantas daninhas.
A presença dessa doença da soja nos talhões pode ser verificada através das folhas das plantas que vão apresentar pontuações pardas, com um halo amarelado ao redor, evoluindo progressivamente para manchas circulares castanhas com anéis concêntricos de coloração mais escura.
Segundo um levantamento publicado pela FRAC em 2021, a incidência da mancha-alvo tem aumentado na cultura da soja nas últimas safras em razão:
- Da utilização de culturas em sucessão que são hospedeiras do fungo, como o algodão e a crotalária;
- Da menor sensibilidade/resistência do fungo a fungicidas;
- Do aumento da semeadura de cultivares suscetíveis.
Praticamente todas as regiões produtoras de soja do Brasil já são acometidas por essa doença, sendo mais intensa na região Centro-Oeste do país.
Por isso, grande parte das estratégias de manejo para a mancha alvo, consiste no tratamento de sementes, na utilização de cultivares resistentes/tolerantes, na aplicação de fungicidas e na rotação/sucessão com culturas não hospedeiras do fungo, como o milho e outras espécies de gramíneas.
É o que recomendam Cláudia Vieira Godoy e os demais autores do livro Manual de Fitopatologia: doenças das plantas cultivadas.
6. O crestamento foliar de cercospora e a mancha púrpura
Mais ao final do ciclo produtivo é possível o surgimento de um conjunto de doenças da soja específicas desse período, conhecidas como complexo de doenças de final de ciclo (DFC).
Dentro desse complexo, estão inclusas doenças como o crestamento foliar de cercospora e a mancha púrpura, ambas causadas pelo fungo Cercospora kikuchii.
O fungo é capaz de atacar todas as partes das plantas, causando pontos e manchas castanho-avermelhadas nas folhas, vagens e hastes da soja.
Quando o ataque é mais severo nas folhas, o C. kikuchii causa o coalescimento e severo crestamento das folhas, induzindo a desfolha prematura das plantas.
Já quando o fungo atinge a semente, ele causa a mancha púrpura no tegumento, reduzindo a germinação e qualidade das sementes.
Lesões nas folhas e sementes causadas pelo fungo Cercospora kikuchii, agente causal do crestamento foliar de cercospora e a mancha púrpura na soja (Fonte: Godoy, C. V. & Henning, A. A. – Embrapa Soja, 2021)
Apesar dos danos causados pelo crestamento foliar de cercospora e pela mancha púrpura por si só não serem tão significativos quanto aos das doenças da soja citadas anteriormente, as perdas normalmente são maiores quando essas doenças estão associadas a outras do DFC.
O controle do crestamento foliar de cercospora e da mancha púrpura geralmente envolve a integração:
- Do tratamento de sementes com fungicidas com ação sistêmica e de contato;
- Da aplicação de fungicidas dos grupos dos benzimidazóis, triazóis e estrobilurinas;
- Da rotação/sucessão da soja com espécies não suscetíveis ao agente causal da doença, como o milho.
Além disso, também é importante que o agricultor faça o manejo adequado da nutrição das plantas e da fertilidade do solo, para minimizar a desfolha das plantas afetadas por essas doenças da soja.
7. A mancha parda
Por fim, outra das doenças da soja inclusa dentro do complexo das DFC é a mancha parda da soja, também conhecida como septoriose, que pode ocorrer de forma associada ao crestamento foliar.
Essa doença pode ser identificada principalmente pela presença de manchas marrom-escuras de formato irregular nas folhas e tem como seu agente causal o fungo Septoria glycines.
Em condições de infecção severa, a mancha parda pode causar desfolhas e a maturação precoce da soja, que comprometem o enchimento de grãos e a produtividade da cultura, com perdas que podem ultrapassar 30%.
Como o fungo apresenta a capacidade de sobreviver em sementes infectadas e restos culturais, a Embrapa recomenda que as formas mais eficientes de controle da mancha parda incluam a rotação de culturas e o acompanhado da melhoria das condições físico-químicas do solo, com ênfase na adubação potássica.
O controle químico com fungicidas é recomendado apenas em condições de infecção severa, podendo ser feito no estádio R5 da soja com triazois, benzimidazois, estrobilurinas e carboxamidas, seguindo as recomendações dos profissionais responsáveis.
O controle das principais doenças da soja envolve diferentes práticas de manejo do agroecossistema
Em resumo, podemos perceber que a soja é uma cultura acometida por uma grande variedade de doenças e que cada uma delas é capaz de afetar a qualidade e a produtividade da cultura de formas diferentes.
Dessa forma, a identificação e o monitoramento corretos delas, aliados a diferentes práticas de manejo do agroecossistema são muito importantes para manter os níveis das diferentes doenças da soja sob controle.
Para isso, o agricultor deve sempre aplicar os princípios do manejo integrado de doenças (MID) na sua propriedade, utilizando desde práticas de controle cultural ao manejo adequado da nutrição das suas lavouras!