Você sabia que é possível recuperar solos contaminados com poluentes e compostos tóxicos indesejados através do uso da técnica de biorremediação do solo? Entenda como isso funciona e conheça um dos microrganismos benéficos do solo usado nessa técnica: a rizobactéria Bacillus aryabhattai!
Qual é o objetivo principal da biorremediação do solo?
A biorremediação do solo pode ser considerada uma importante solução para a descontaminação de solos que recebem uma alta carga de poluentes e compostos tóxicos indesejados, uma vez que ela tem por objetivo a degradação ou remoção dessas substâncias do ambiente.
Segundo a pesquisadora Arlete Moyses Rodrigues, no artigo Produção do espaço e ambiente urbano, a industrialização agrícola nas últimas décadas acabou provocando o aumento dos fluxos de resíduos nos sistemas agrícolas, bem como o aumento da frequência de acidentes com diferentes poluentes.
Portanto, a biorremediação do solo tem se tornado uma técnica chave para lidar com os diversos desafios advindos da poluição do solo com diferentes tipos de resíduos contaminantes.
Diferentemente de outras técnicas usadas para o tratamento de solos contaminados, a biorremediação pode ser considerada uma das mais economicamente acessíveis e ambientalmente sustentáveis.
Isso porque uma das formas de executá-la é com melhoria da qualidade biológica do solo, uma vez que os agentes que permitem a degradação ou remoção de substâncias contaminantes do ambiente são os processos biológicos realizados pelos microrganismos benéficos.
Os microrganismos podem ajudar a descontaminar e a recuperar solos poluídos, através da técnica de biorremediação do solo.
A biorremediação do solo pode ser realizada de duas formas: “in situ”, no local onde ocorreu a contaminação, ou “ex situ”, quando a porção contaminada do solo é levada para tratamento em outro lugar.
Dessa forma, é possível implementar a biorremediação do solo usando microrganismos nos processos agrícolas de diferentes formas. Entre elas, estão:
- Bioestimulação: cujo objetivo é aumentar a atividade microbiana da população nativa do solo, com a adição de nutrientes, de substâncias que aumentam a biodisponibilidade do material contaminante para que os microrganismos possam degradá-lo, como surfactantes ou tensoativos, e da melhoria dos parâmetros do solo, como a aeração, umidade e o pH;
- Bioaumentação: cujo objetivo é introduzir microrganismos específicos dentro do ecossistema natural contaminado, buscando reduzir a sua concentração ao longo do tempo através do processo biológico de degradação promovido pelos microrganismos.
No caso da última alternativa para introduzir a biorremediação no solo nos sistemas agrícolas, diversos estudos vêm mostrando que algumas bactérias da rizosfera, endofíticas e promotoras de crescimento de plantas são capazes de degradar ou remover substâncias contaminantes do ambiente.
Esse é o caso da rizobactéria Bacillus aryabhattai, um microrganismo promotor de crescimento de plantas que vem sendo o foco de muitas pesquisas.
Como funciona a biorremediação do solo promovida pelo Bacillus aryabhattai?
O Bacillus aryabhattai é uma espécie de rizobactéria gram positiva que foi isolada e identificada pela primeira vez em 2009 e que tem chamado a atenção dos pesquisadores pela sua versatilidade e capacidade de melhorar o manejo agrícola.
Sua descoberta que foi atribuída a S. Shibavi e outros pesquisadores autores do artigo Janibacter hoylei sp. nov., Bacillus isronensis sp. nov. and Bacillus aryabhattai sp. nov., isolated from cryotubes used for collecting air from the upper atmosphere.
Essa espécie pertence a um grupo de microrganismos conhecidos como rizobactérias promotoras de crescimento de plantas (RPCP, ou, na sigla em inglês, PGPR) e que tem sido amplamente investigado nos últimos anos.
Estima-se que o número de estudos relacionados à microbiota do solo e suas funções cresceu praticamente 13 vezes em relação ao início dos anos 90, visto os diferentes benefícios que eles podem oferecer aos agroecossistemas.
Além dos benefícios que o B. aryabhattai pode promover nos sistemas agrícolas para o crescimento, nutrição e melhoria da resistência das plantas a estresses, estudos indicam que essa rizobactéria é capaz de fazer a biorremediação de resíduos herbicidas, como o glifosato e o Paraquat, e de inseticidas organofosforados, como o Paration, dentre outras substâncias.
O glifosato (N-(fosfonometil)glicina) e o Paraquat estão entre os herbicidas não seletivos mais usados na agricultura, visto o seu amplo espectro para controle de uma grande variedade de plantas daninhas.
Devido a elevada toxicidade dos produtos, ambos estão associados a diversos problemas para a saúde humana, que incluem hipotireoidismo, doenças renais crônicas, câncer e defeitos congênitos.
No caso do Paraquat, o aumento dos incidentes de contaminação humana pelo mau uso da tecnologia de aplicação do herbicida foi tão acentuado que acabou levando ao banimento do seu ingrediente ativo no ano de 2017 pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Por isso, a biorremediação de solos contaminados com os resíduos desses herbicidas ganhou uma grande importância nos últimos anos.
Dependendo da substância contaminante, o Bacillus aryabhattai pode utilizar diferentes mecanismos para sua degradação. No caso do glifosato, existem duas principais rotas metabólicas.
A primeira delas depende da atividade da enzima C-P liase, que cliva a ligação de carbono e fósforo presente na molécula do glifosato ou degrada o glifosato em sarcosina, que será posteriormente oxidada.
Já a segunda rota envolve a presença da enzima glifosato oxidorredutase (GOX), que é capaz de clivar a ligação de carbono e nitrogênio ao lado da carboxila, produzindo AMPA (ácido aminometilfosfônico) e o glioxilato.
No caso da rizobactéria Bacillus aryabhattai, foi constatada a atividade da enzima GOX através de pesquisas envolvendo diferentes ferramentas de bioinformáticas.
É o que explicam Nagwa I. Elarabi e outros pesquisadores, no artigo Bacillus aryabhattai FACU: A promising bacterial strain capable of manipulate the glyphosate herbicide residues.
Nesse mesmo estudo, os pesquisadores ainda observaram que essa rizobactéria apresentou inclusive melhores taxas de crescimento sobre diferentes concentrações de glifosato do que quando sob condições naturais.
No caso da biorremediação dos resíduos de inseticidas organofosforados, como o Paration, estudos indicam que essa substância é degradada pela ação de dois principais metabólitos produzidos pelo B. aryabhattai: o 4-nitrofenol e 4-nitrocatecol.
No estudo Degradation of organophosphate insecticide by a novel Bacillus aryabhattai strain SanPS1, isolated from soil of agricultural field in Burdwan, West Bengal, India, os pesquisadores observaram que a degradação do Paration por essa rizobatéria acontecia concomitantemente com a formação desses metabólitos.
Via proposta da degradação do Paration por uma cepa de Bacillus aryabhattai, uma rizobactéria que apresenta um grande potencial para ser utilizado na biorremediação do solo (Fonte: PAILAN et al., 2015)
Além de herbicidas e inseticidas, outras pesquisas mostram que essa rizobactéria é capaz de fazer a biorremediação de solos contaminados com outros tipos de compostos indesejados, como o arsênico e materiais lignocelulósicos, como corantes.
O arsênico é uma substância cancerígena que pode ser encontrada no solo. As formas mais biodisponíveis do arsênio correspondem ao As (V) e As (III), sendo esse último considerado mais móvel e mais tóxico aos seres vivos.
Mesmo assim, pesquisas indicam que o B. aryabhattai é capaz de realizar a conversão dessa substância tóxica e ainda se mantendo viável e metabolicamente ativo durante todo o processo.
É o que descrevem Pallab Kumar Ghosh e outros pesquisadores, no artigo The role of arsenic resistant Bacillus aryabhattai MCC3374 in promotion of rice seedlings growth and alleviation of arsenic phytotoxicity.
Já no caso da biorremediação de solos contendo materiais lignocelulósicos, como corantes, estudos relacionam a capacidade de degradação desse material pelo B. aryabhattai à produção de algumas enzimas específicas.
A celulase, lacase, peroxidase e pectinase estão entre as principais enzimas produzidas por essa rizobactéria que apresentam capacidade para degradar compostos dessa natureza.
Entretanto, alguns estudos destacam que a produção dessas enzimas depende do atingimento de um limiar mínimo da substância contaminante no solo, para que a resposta desse microrganismo seja provocada. Por isso, o uso de substâncias que aumentam a biodisponibilidade do material contaminante nesse caso, como surfactantes ou tensoativos, pode ser bastante viável.
É o que explicam Alicia Paz e outros pesquisadores, no artigo Biotransformation of phenolic compounds by Bacillus aryabhattai.
Portanto, podemos concluir que a rizobactéria B. aryabhattai é um excelente microrganismo para ser utilizado na técnica de biorremediação do solo, visto a sua grande resiliência nos agroecossistemas e a grande diversidade de substâncias contaminantes que podem ser degradadas ou imobilizadas pela sua atuação.
O Bacillus aryabhattai é uma alternativa promissora para biorremediação de solos contaminados na agricultura
Em conclusão, podemos afirmar que a técnica da biorremediação do solo está se tornando uma técnica cada vez mais valorizada na agricultura, visto o seu potencial para realizar a descontaminação dos solos de forma economicamente e ambientalmente sustentáveis.
Para executá-la, o agricultor pode utilizar microrganismos que apresentam um grande potencial para realizar a degradação ou remoção de substâncias contaminantes do solo, como o Bacillus aryabhattai.