Você sabia que várias espécies de nematoides estão distribuídas por grande parte das principais regiões brasileiras produtoras de café e que o seu ataque pode limitar a produtividade da cultura? Saiba como fazer a identificação de nematoides no café e quais as principais práticas de controle dessa praga no campo!
Quais os danos causados por nematoides em plantas de café?
Os nematoides são uma praga de grande relevância econômica para o cultivo do café no Brasil, uma vez que os danos causados pelos nematoides nas raízes do cafeeiro podem comprometer significativamente a produtividade da cultura.
Estudos indicam que algumas espécies de nematoides podem causar perdas de produtividade do café de até 45% mesmo em cultivos altamente tecnificados.
Isso acontece porque existe um grande número de nematoides que são fitoparasitas e acabam se alimentando das raízes das plantas durante parte do seu ciclo de vida.
Quando eles se alimentam externamente das raízes, dizemos que os nematoides são ectoparasitas. Já quando eles invadem os tecidos radiculares e permanecem grande parte do seu ciclo de vida dentro deles, dizemos que eles são endoparasitas.
Entretanto, esse hábito alimentar acaba destruindo severamente o sistema radicular do café, limitando a manutenção das áreas infestadas e a implantação de novos cultivos.
De forma geral, o ciclo de vida de um nematoide começa com os ovos, que são depositados no solo ou nas raízes das plantas. Deles eclodem as fases juvenis dos nematoides, que passam normalmente por quatro estádios de desenvolvimento, denominados J1, J2, J3 e J4, até atingir a sua maturidade sexual.
Nos cafezais, existem dois grandes grupos de nematoides no café que podem afetar a cultura: os nematoides das galhas radiculares e os nematoides das lesões radiculares.
Os nematoides das galhas radiculares englobam as espécies do gênero Meloidogyne, sendo o M. exigua, M. incognita e M. paranaensis as espécies de nematoides do café mais relevantes para a cultura.
Grande parte dos danos causados por esses fitonematoides estão relacionados ao processo de parasitismo das fêmeas dessas espécies, que penetram as raízes do cafeeiro em seu estádio juvenil J2 e estabelecem um local de alimentação junto ao sistema vascular das plantas.
Já no caso dos nematoides das lesões radiculares, todas as fases de desenvolvimento dos nematoides pós-emergentes dos ovos são consideradas como infestantes e podem causar sintomas nas plantas de café similares aos nematoides das galhas, como:
- A redução do vigor e do tamanho das plantas;
- O amarelecimento das folhas;
- A destruição das raízes.
Para a cultura do café, as principais espécies dos nematoides das lesões radiculares de importância econômica pertencem ao gênero Pratylenchus, sendo as espécies P. coffeae, P. jaehni e P. brachyurus as principais representantes desse grupo.
Estudos apontam que essas espécies de nematoides no café podem ser tão agressivas quanto os nematoides das galhas, sendo a espécie P. brachyurus a mais disseminada nos cafezais brasileiros.
Mas, na prática, como é feita a identificação dessas diferentes espécies de nematoides?
Como identificar nematoides no café?
A identificação de nematoides no café, assim como em outras culturas, nem sempre é uma tarefa fácil. Isso porque essas pragas do café normalmente apresentam um tamanho microscópico.
Contudo, no campo é possível ter uma noção de qual grupo de nematoides pode estar atacando as plantas.
Essa diferenciação pode ser feita observando a presença de estruturas globosas nas raízes dos cafeeiros conhecidas como galhas. Elas que são um forte indicativo da presença de espécies de nematoides das galhas no café.
Caso essa estrutura não seja observada e exista uma maior presença de raízes necrosadas, essas características podem indicar a presença dos nematoides das lesões radiculares.
Raízes de café (D) e pimentão (A) exibindo galhas induzidas pelo nematoide das galhas Meloidogyne exigua e detalhas das galhas (B e C) apresentando massas de ovos externas coloridas com fuccina ácida (Fonte: Silva et al., 2008)
No mais, aferições mais precisas das espécies de nematoides no café exigem a adoção de análises laboratoriais de amostras de solo com raízes.
A amostragem do solo para análise de nematoides no café, recomenda-se que o agricultor faça uma coleta de solo representativa dos seus talhões.
Para isso, devem ser coletadas de 10 a 20 subamostras por hectare, tentando manter uma proporção na amostra composta final de 1 kg de solo (com umidade natural) e 100 g de raízes.
Além disso, é importante destacar que a realização dos exames laboratoriais fitopatológicos é obrigatória no caso de produção de mudas de café. Conforme descreve o artigo 8º da Portaria da Coordenadoria de Defesa Agropecuária (CDA) nº 4, de 28/01/2011.
Para a avaliação de mudas de café, recomenda-se realizar a amostragem de 0,1% das mudas de lotes homogêneos de 20.000 a, no máximo, 50.000 mudas da mesma cultivar e com a mesma idade.
E, uma vez identificada as espécies de nematoides no café, podem ser tomadas ações mais assertivas para o controle dessa praga nos cafezais.
Como controlar nematoides no café?
Um dos grandes desafios do manejo e controle dos nematoides no café é que muitas espécies acabam tendo alguns hospedeiros secundários que estão presentes durante o ciclo da cultura, como as plantas daninhas e as culturas consorciadas com o café.
Esse é o caso do P. brachyurus, que também tem como hospedeiro a braquiária, uma gramínea muito utilizada na entrelinha do café por trazer diversos benefícios para a melhoria da qualidade do solo.
No artigo Consorciação e manejo de Brachiaria decumbens em mudas de cafeeiros infestados com Pratylenchus brachyurus em condições de casa de vegetação, Roberto Kazuhiro Kubo e outros pesquisadores observaram, por exemplo, necroses mais acentuadas com muitas raízes escurecidas e uma maior população final de P. brachyurus em plantas de café consorciada com braquiária.
Efeito do manejo de Brachiaria decumbens no desenvolvimento das raízes e parte aérea de cafeeiro, cv. ‘Catuaí Vermelho’, infestados pelo nematoide das lesões Pratylenchus brachyurus (Fonte: Kubo et al., 2015)
Dessa forma, podemos afirmar que em cafezais onde se adota o cultivo em consórcio com outras culturas ou há a presença de plantas daninhas nas entrelinhas, é preciso tomar um cuidado ainda maior para alcançar um controle efetivo dos nematoides no café e evitar a manutenção de altas populações dessa praga no solo.
Um dos primeiros passos para garantir um bom controle dos nematoides no café consiste em evitar a entrada e disseminação dessas pragas nos talhões.
Para isso, o cafeicultor deve sempre buscar adquirir mudas certificadas e sadias, realizar a limpeza adequada de equipamentos e implementos agrícolas e fazer o manejo da lavoura na ordem das áreas menos infestadas para aquelas mais infestadas.
Complementarmente, o uso de adubos verdes em sistemas de rotação ou consorciação de culturas e adubos orgânicos, como a torta de mamona, também têm mostrado bons resultados a campo quando adotados junto a outras medidas para o controle de nematoides no café.
Outra prática de controle de caráter curativo que tem sido empregada com sucesso, tanto em áreas não infestadas como nas infestadas, é o plantio de cafeeiros resistentes com o uso de pés francos ou porta-enxertos resistentes.
No Brasil, casos de sucesso dessa prática já foram obtidos com o plantio de:
- Cafés enxertados com o porta enxerto Coffea canephora cv Apoatã, que é resistente aos nematoides exigua e M. incognita;
- Cultivares Icatu H4782-7514 e Sarchimor C1669-33, que são resistentes ao nematoide brachyurus;
- Cafeeiro Konillou IAC 4764 e IAC 4765, que é resistente a população K5 do jaehni.
Por fim, uma outra prática que também tem demonstrado resultados promissores nas pesquisas é o uso do silício para o controle dos nematoides no café.
No artigo Biochemical responses of coffee resistance against Meloidogyne exigua mediated by silicon, o Dr. Fabrício Rodrigues e seus colegas inocularam ovos do parasita em duas diferentes cultivares de café C. arabica. As mudas foram tratadas com diferentes fertilizantes, incluindo doses de silício.
Após 120 dias, os pesquisadores avaliaram parâmetros como a quantidade de ovos presentes nas raízes do café, bem como a penetração dos nematoides no sistema radicular.
Nos pés de café tratados com silício, houve redução da capacidade reprodutiva do nematoide nas raízes, associado ao aumento da produção de lignina e da atividade das enzimas peroxidase de fenóis (POX), polifenoloxidase (PPO) e fenilalanina amonialiase (PAL), especialmente para cultivares suscetíveis à infecção.
Ao final desse estudo, os pesquisadores concluíram que os pés de café que receberam o tratamento com silício tiveram uma resposta bioquímica mais eficiente contra a infecção e ressaltaram que a aplicação desse elemento benéfico é uma prática que idealmente se encaixa em estratégias ecologicamente amigáveis para a produção sustentável de café no Brasil.
A adubação com silício é capaz de promover a melhoria da resistência das plantas a pragas, doenças e estresses abióticos.
Assim, uma gama variada de estratégias pode ser utilizada pelo agricultor no combate aos nematoides no café!
O controle de nematoides no café exige a adoção de práticas de controle preventivas e curativas
Como podemos perceber, as lavouras de café podem ser atacadas por uma grande variedade de espécies de nematoides, causando danos severos no sistema radicular das plantas que impactam negativamente no desenvolvimento e produtividade da cultura.
Por isso, recomenda-se que o agricultor sempre adote diversas práticas de controle preventivas, como o plantio de mudas sadias, e curativas, como a aplicação de silício, para evitar que as infestações dessa praga no campo prejudiquem o potencial produtivo e de qualidade das suas lavouras!