A fisiologia vegetal sempre foi uma grande aliada dos estudos de seleção de cultivares e da pesquisa para desenvolvimento de insumos agrícolas. No entanto, a compreensão sobre bioquímica e o metabolismo das plantas não costuma atravessar as fronteiras das fazendas como uma ferramenta para o produtor. Entenda porque é importante analisar os aspectos fisiológicos para que o planejamento da sua propriedade e o manejo do seu cultivo sejam mais eficientes.
A importância da fisiologia vegetal e os estereótipos que a cercam
Na maioria das vezes em que se inicia uma explicação sobre metabolismo ou bioquímica os inúmeros termos diferentes e nomes difíceis funcionam como um bloqueio quase imediato. Eles parecem ser coisas importantes, mas distantes do dia a dia de uma propriedade e que só podem ser compreendidas por especialistas.
No entanto, essa distância pode simplificada quando conseguimos extrair o básico do conhecimento e entender como esses processos estão no dia a dia do agricultor.
Conhecer esse básico pode funcionar como um “tradutor” da linguagem entre as cultivares, o manejo empregado e os insumos utilizados.
Processos envolvidos na fotossíntese. Apesar da aparente complexidade, os processos bioquímicos estudados pela fisiologia vegetal são a tradução da linguagem das plantas. (Fonte da imagem)
Atualmente, é impossível dissociar a evolução de tecnologias agrícolas das descobertas sobre a fisiologia das plantas.
A fisiologia vegetal é uma das grandes responsáveis pela agilidade da implementação de novas soluções no setor e foi uma das principais ferramentas para o desenvolvimento das tecnologias para o campo na Revolução Verde.
Com a compreensão da bioquímica vegetal, vários mecanismos-chaves que coordenam respostas nas plantas puderam ser manipulados para que tivéssemos objetivos específicos atingidos.
Por exemplo, um produto famoso na utilização da manipulação da bioquímica vegetal a favor do manejo é o 2,4-D (abreviação para ácido diclorofenóxiacético).
Esse herbicida, utilizado desde a década de 1940, tem uma estrutura similar ao ácido-indolacético (AIA) e se comporta na planta de forma semelhante a uma auxina que é um hormônio relacionado à regulação do crescimento.
A aplicação exógena desse elemento e o aumento da concentração do mesmo no organismo vegetal gera uma cadeia de desequilíbrios metabólicos que culminam na senescência e morte de eudicotiledônias, as plantas de folha larga.
Dessa forma, lavouras de monocotiledôneas como milho, arroz e pastagens podem se beneficiar de um produto seletivo e eficaz para controle de plantas daninhas.
Entretanto, da mesma forma que o 2,4-D é empregado há cerca de 80 anos como uma solução, seu uso sem cuidados adequados causa enormes problemas.
Os problemas causados pela deriva durante sua aplicação em lavouras já é assunto de justiça em alguns estados onde produtores de “plantas de folha larga”, como sojicultores e olivicultores, têm suas lavouras drasticamente afetadas pelo efeito desse produto.
Outros produtos herbicidas, promotores de crescimento e mitigadores de estresses disponíveis no mercado são resultado de seleções semelhantes de elementos químicos.
Esses produtos são moléculas estruturalmente similares a substâncias presentes nas plantas e que, quando aplicados em um alvo específico, podem colaborar com o manejo gerando as respostas que esperamos dos vegetais.
Percebemos, assim, a importância de ultrapassar a barreira das palavras difíceis e entender sobre os mecanismos vegetais e a ação das tecnologias que utilizamos nas plantas cultivadas.
A relação entre as respostas fisiológicas e o manejo agrícola
Como as plantas são incapazes de se locomover, é necessário que elas consigam meios de reagir a tudo o que acontece no ambiente em que estão inseridas.
Dessa forma, diversos mecanismos foram desenvolvidos ao logo da evolução das espécies para que elas estivessem adaptadas às condições do local em que vivem.
Assim, a atividade agrícola teve que considerar desde o início a seleção de plantas que estivessem mais adaptadas aos ambientes onde gostaríamos de cultivá-las. De forma indireta, as respostas fisiológicas mais interessantes eram escolhidas no desenvolvimento de cultivares.
O processo de seleção plantas com respostas fisiológicas mais adaptadas a diversas condições permitiu, por exemplo, que conseguíssemos no Brasil implementar culturas no cerrado.
Além de ações intensivas no manejo de solos para torná-los agricultáveis, a escolha de características fisiológicas adaptadas à sazonalidade, regime pluviométrico e temperaturas da região também foi essencial para o êxito das cultivares.
A pesquisa agrícola continua trabalhando ao lado da fisiologia vegetal para tornar o manejo cada vez mais eficiente. Além da essencial seleção das características fisiológicas de uma linhagem se escolhe o que plantar, temos produtos no mercado que atuam em mecanismos específicos das plantas para colaborar no manejo.
Hoje em dia contamos com uma enorme gama de produtos que mimetizam hormônios vegetais, por exemplo. Esses hormônios são responsáveis por orquestrar o metabolismo das plantas nas suas diferentes etapas de desenvolvimento.
Assim, com a aplicação desses hormônios em momentos adequados é possível estimular a germinação, coordenar mecanismos de resistência, ou atuar no florescimento e desenvolvimento de frutos.
Os produtos que utilizam esses hormônios são chamados de estimulantes vegetais, e entender a forma como eles atuam na planta é importantíssimo para seu uso adequado. Saber como e quando “nos comunicar” com a planta interferindo em seu metabolismo é essencial para que não ocasionemos danos no lugar de benefícios.
Hormônios vegetais e fases do desenvolvimento vegetal. O balanço entre esses hormônios regula os processos metabólicos vegetais, compreendendo como eles funcionam podemos nos comunicar com a planta em momentos chave da cultura. (Adaptado de: Integrated Crop Management)
A relação entre nutrição agrícola e a fisiologia vegetal
Assim como o desenvolvimento de cultivares, herbicidas e estimulantes considera as características fisiológicas, as tecnologias de nutrição das plantas também estão diretamente relacionadas a elas.
Como sabemos, o rendimento das culturas depende de uma disponibilização adequada de macro e micronutrientes durante cada estádio de desenvolvimento das mesmas.
Entendendo esse aspecto, é muito importante que as fontes utilizadas na nutrição da lavoura considerem toda a cadeia que culmina na produtividade: a interação com ambiente, os tratos culturais e, claro, as particularidades fisiológicas da cultivar.
Macronutrientes como nitrogênio, fósforo, potássio e enxofre fazem parte de processos essenciais e são requeridos durante todo o desenvolvimento da planta.
Cada cultura demanda volumes distintos desses nutrientes, entretanto, por serem minerais essenciais para o metabolismo das plantas, esses nutrientes devem estar disponíveis de forma uniforme durante todo o ciclo das culturas.
O uso de soluções de nutrição que não lixiviem facilmente e que possam disponibilizar esses produtos gradualmente durante as etapas fenológicas do cultivo podem garantir mais tranquilidade ao produtor no decorrer da safra, disponibilizando mais tempo para dar atenção a outros pontos do manejo.
Micronutrientes envolvidos em diferentes estádios de desenvolvimento vegetal. Alguns mecanismos fisiológicos são responsivos à disponibilidade de nutrientes, dessa forma, a nutrição adequada em cada etapa do desenvolvimento da planta garante respostas adequadas na produtividade das culturas. (Adaptado de: Academia da Semente)
Da mesma forma, os micronutrientes são essenciais para o metabolismo estando envolvidos em processos importantes para o sucesso do desenvolvimento vegetal. No entanto, esses minerais são requeridos em volumes menores, o que não diminui a sua importância, uma vez que são chaves em processos específicos no ciclo das plantas.
Podemos citar, por exemplo, o envolvimento do boro no processo reprodutivo vegetal. Esse micronutriente está envolvido na germinação do grão de pólen e crescimento do tubo polínico, ou seja, sua presença garante a viabilidade dos frutos que são o objetivo da maioria das cultivares agrícolas.
Percebemos então que, apesar da menor demanda por esse grupo de nutrientes, garantir que os mesmos estejam disponíveis é essencial para o sucesso das culturas.
Entender a fisiologia vegetal é essencial para o melhor manejo da lavoura
A produção vegetal é, portanto, uma relação direta entre condições ambientais, características da cultivar, e respostas fisiológicas do manejo empregado.
Conseguir entender quais os processos fisiológicos envolvidos no desenvolvimento vegetativo e reprodutivo, nas respostas a estresses e até mesmo nos sintomas aparentes das plantas relacionados a algum estímulo é essencial para decidir quais as estratégias adequadas para a lavoura em cada momento.