Falta de gás natural na Europa traz o perigo de escassez de fertilizantes e aumento de preços de alimentos

Falta de gás natural na Europa traz o perigo de escassez de fertilizantes e aumento de preços de alimentos

A atual falta de gás natural na Europa provavelmente vai ter impactos sociais e políticos mais sérios do que os aumentos de preço da gasolina que são um pesadelo para o governo do Presidente dos Estados Unidos, Joe Biden.

O problema vai além da ameaça imediata da escassez de energia, ou mesmo da possibilidade de apagões em meio a temporadas de frio prolongadas.

O gás natural responde por cerca de 80% dos custos variáveis da produção de componentes essenciais da fabricação de fertilizantes nitrogenados, como a amônia. O preço da amônia na Europa quase triplicou entre janeiro e março. E preços de fertilizantes mais caros têm um impacto sobre a oferta de alimentos.

Congelar no escuro enquanto se passa fome não deixa os eleitores felizes. Na melhor das hipóteses, no próximo ano ou no seguinte, os agricultores europeus terão que absorver grandes aumentos nos preços dos fertilizantes, talvez economizando na aplicação dos mesmos. E isso leva a rendimentos menores das lavouras e então a preços mais altos de alimentos.

Se os preços das importações de gás natural na Europa permanecerem altos, parte da sua indústria de produção interna de fertilizantes pode parar por períodos prolongados ou até mesmo fechar permanentemente. Já em outubro, o gargalo no mercado de gás natural levou a significativas reduções na produção europeia de fertilizantes por parte de empresas como a Yara, BASF, CF Industries e Fertiberia.

E não, esses recursos energéticos simplesmente não poderiam ser substituídos por uma intensificação da reciclagem de resíduos orgânicos de alimentos, resíduos industriais ou esterco. A reciclagem na Europa já é bastante eficiente.

A situação fica pior ainda: os aumentos do preço do gás natural e a falta desse recurso afeta a produção de componentes nitrogenados dos fertilizantes utilizados pelos agricultores. Além disso, agora também há aumentos significativos no preço dos outros principais fertilizantes minerais, como o fosfato e o potássio, juntamente com o enxofre.

A Europa importa a maioria dessas matérias-primas, o que se soma a uma crescente porção do gás natural que o continente utiliza. Produtores internacionais, no entanto, estão limitando as exportações esse ano para dar suporte a sua agricultura doméstica.

A China, que é o maior produtor de fosfato do mundo, suspendeu ou limitou severamente as exportações de fertilizantes fosfatados, começando no final de julho. Esses cortes devem se prolongar até junho de 2022.

A Rússia anunciou restrições nas exportações de fertilizantes nitrogenados e fosfatados por seis meses, a partir do dia 01 de dezembro. Isso tem de fato o efeito de subsidiar os agricultores internos, reduzindo os preços domésticos de comida e melhorando as perspectivas de exportação de grãos da Rússia

Os produtores agrícolas europeus vão ter que absorver aumentos nos preços de fertilizantes

Algumas das exportações russas e chinesas de fosfatos serão substituídas pela OCP, empresa que representa o monopólio marroquino do fosfato. Mesmo antes dessa demanda extra, os ganhos da OCP calculados sem juros, taxas, depreciação e amortização subiram 48% no primeiro semestre.

Além disso, as reduções das exportações da Rússia e da China não são as únicas restrições comerciais que irão afetar a Europa. Até agora, as sanções da União Europeia ao regime do presidente Lukashenko na Bielorrússia não levaram em conta o potássio vindo das minas da Belaruskali, o monopólio estadual de potássio bielorrusso.

No entanto, as sanções dos Estados Unidos à Bielorrússia, que têm o objetivo de cortar praticamente toda a exportação de potássio daquele país, cerca de um quinto da oferta mundial, e que haviam sido adiadas devem entrar em vigor em breve.

Muito do potássio da Bielorrússia é exportado através de estruturas portuárias dedicadas na Lituânia com uma ampla visibilidade. Isso faz com que seja difícil para o país evitar as sanções através desse meio.

A Bielorrússia poderia exportar o seu potássio através de conexões ferroviárias na Rússia, mas esse país tem o seu próprio produtor de potássio relevante, a Uralkali.

É de se imaginar que a Uralkali e seus aliados vão tomar conta de seus interesses primeiro, o que provavelmente inclui evitar o regime de sanções norte-americanas. Junto com qualquer possível aumento nas exportações de potássio da Uralkali, a diminuição da fatia de mercado da Belaruskali poderia fazer com que houvesse um aumento de envios de potássio da Nutrien, o grupo canadense de fertilizantes, aumentasse.

O relatório financeiro do terceiro trimestre da Nutrien, lançado em outubro, revelou que o EBITDA da empresa para vendas de potássio já subiu 131% neste ano. Antecipando as sanções à Bielorrússia, a Nutrien declarou que “aumentaria a produção de potássio para uma taxa de 17 milhões de toneladas durante o quatro trimestre”.

Não de graça, obviamente: os preços dos produtos de potássio da Nutrien vendidos fora da América do Norte já subiram 105% este ano.

Claro que os preços de fertilizantes já tiveram grandes aumentos no passado, para logo em seguida caírem à medida que a capacidade de produção desses insumos subiu e os agricultores diminuíram o seu uso de fertilizantes.

A diferença dessa vez, em particular na Europa, é que as políticas relacionadas à questão climática fazem com que não haja financiamento disponível para a expansão da produção de gás natural.

Os agricultores podem racionar o uso do potássio e do fósforo por uma safra ou duas, mas as colheitas irão diminuir rapidamente sem o uso de fertilizantes nitrogenados.

Assim, o dilema de reduzir as emissões de carbono enquanto se mantém a produção de alimentos ainda não foi resolvido.

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