Apesar da geada ser um fenômeno recorrente e natural nos ciclos anuais da cafeicultura, estimativas da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) apontam que ela pode ser responsável pela redução de quatro a onze milhões de saca de café Arábica na safra de 2022. Então, como lidar com a ocorrência desse fenômeno? Entenda como mitigar os impactos da geada na produtividade da cultura do café.
Os impactos da geada na cafeicultura
A geada é um fenômeno natural que se manifesta próximo ao chão com a queda das temperaturas durante a noite, levando ao forte resfriamento do ar. Em condições de alta umidade na atmosfera, ela também provoca a formação de gelo na superfície das plantas (geada branca), mas ela pode vir sem a presença do gelo (geada negra).
As baixas temperaturas são causadas, geralmente, pelas massas de ar polar vindas dos Andes ou do Oceano Atlântico e podem danificar os tecidos vegetais, prejudicando a produtividade e em casos mais graves levando à morte das plantas.
Para o cafeeiro, a temperatura letal é menor que -2ºC e nessas condições a cultura costuma ser afetada por geadas denominadas popularmente como de “canela” ou de “capote”, dependendo da parte da planta afetada.
Na geada de canela, o ar frio desce para perto do tronco das plantas e causa o congelamento da seiva nos vasos condutores, principalmente de cafezais de até 1,5 anos. Já na geada de capote, somente a parte externa das plantas é atingida, queimando as folhas e os ramos superiores.
Os danos estruturais e fisiológicos da geada podem levar ao comprometimento da produtividade dos cafezais. Antes das geadas de julho de 2021, por exemplo, a Conab tinha expectativa que a safra de 2022 fosse 10% superior à de 2020. Contudo, foram estimadas quedas de produção de até 30% nos principais estados atingidos pelas geadas.
Estimativa empírica da Conab de produção de café Arábica antes e após a geada de julho de 2021.
(Fonte: Conab)
Considerados os impactos que a geada pode gerar na cultura do café, como mitigar esses danos?
Ações preventivas para reduzir os efeitos da geada nos cafezais
As ações preventivas para reduzir os efeitos da geada nos cafezais visam mitigar parcialmente ou totalmente as principais causas que levam ao fenômeno desde as etapas iniciais de implantação da lavoura.
A primeira delas envolve a escolha criteriosa da área para o plantio das lavouras do café, evitando áreas afetadas mais intensamente pelas geadas, como os fundos de vale. O agricultor pode se utilizar das técnicas de zoneamento agroclimático para fazer essa avaliação e entender se sua região é apta ao cultivo escolhido e os riscos climáticos que ele pode vir a estar exposto.
No artigo Efeito da geada em mudas de café sob diferentes métodos de proteção, Paulo Henrique Caramori e seus colegas pesquisadores concluíram que, nas condições experimentais da pesquisa, os métodos de proteção que apresentaram os melhores resultados foram o enterrio e a cobertura de cepilho das plantas.
Técnica de enterrio utilizada em cafeeiros jovens, para mitigar os efeitos da geada (Fonte: A.S. Viana, P.M.S. Viana e A.L. Garcia, Procafé)
Além das práticas de proteção direta das plantas, também existem práticas indiretas como a arborização sistemática da lavoura. As árvores proporcionam a menor amplitude térmica da lavoura e ainda trazem benefícios como:
- Redução da incidência e disseminação de pragas e doenças, pela ação quebra-vento;
- Maior diversificação biológica, ciclagem de nutrientes e sequestro de carbono;
- Diversificação da renda da propriedade, dependendo da espécie cultivada.
Outro método indireto inclui a nutrição adequada, partindo-se do princípio de que plantas com maiores concentrações de carboidratos e proteínas tendem a suportar melhor o frio.
Além disso, alguns nutrientes, como o enxofre e o silício, possuem ações específicas que conferem resistência aos efeitos da geada.
Enquanto o enxofre confere uma maior resistência das plantas ao frio, por participar da formação de ligações dissulfídricas, o silício fortalece a estrutura vegetal, ajudando a manter as células das plantas mais íntegras e sem rompimentos causados pelo congelamento.
Mas, e se os danos da geada já estiverem sido estabelecidos na lavoura?
Recuperação das lavouras de café afetadas pelas geadas
A recuperação das lavouras de café afetadas pelas geadas deve ter início apenas 30 a 60 dias após o frio passar, para se ter uma noção concreta de onde e como atuar nos talhões que precisarão ser renovados ou substituídos.
Pra iniciar a recuperação das lavouras de café afetadas pelas geadas, o agricultor pode aguardar as primeiras chuvas e até mesmo a florada. (Fonte: SULEIMAN, K. – Embrapa Rondônia)
A necessidade de poda deve ser avaliada de acordo com a região afetada da planta afetada pela geada. A Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (EPAMIG) destaca que, quanto menos drástica a poda, melhor.
A instituição também recomenda as seguintes ações, de acordo com a extensão do dano:
- Dano superficial nas bordas de toda a planta: não realizar nenhuma ação;
- Dano severo do terço superior do cafeeiro: poda por decote, eliminando apenas a parte morta;
- Dano severo em grande parte dos ramos plagiotrópicos: poda por esqueletamento, cortando no início da porção dos ramos que estão vivos para eliminar apenas as partes mortas;
- Dano severo nos ramos plagiotrópicos e ortotrópico: poda de recepa, cortando um pouco abaixo do limite de tecidos mortos da planta;
- Morte de plantas: verificar a proporção de plantas mortas e decidir ou não pela renovação do cafezal.
Contudo, a recuperação da capacidade produtiva das lavouras afetadas pela geada é vista somente no próximo ciclo produtivo. Para os danos causados em 2021, por exemplo, EPAMIG estima que a recuperação deve se iniciar apenas em 2024 e deve se estabilizar em 2025 ou 2026.
Então, o que fazer até essa recuperação?
O foco deve estar nas ações preventivas
Até que as lavouras consigam se recuperar plenamente, estabilizando os níveis de produção, o cafeicultor deve ir trabalhando o seu fluxo de caixa e implementar ações preventivas nas lavouras.
O foco deve estar nas ações preventivas, que vão desde a escolha estratégica dos locais de implantação das lavouras a utilização dos fertilizantes certos, a fim de realizar um manejo nutricional adequado, que permita que o cafezal seja mais capaz de resistir as geadas.