Nas últimas décadas, pesquisas conduzidas pelo renomado agrônomo Eurípedes Malavolta e outros estudiosos na área têm demonstrado que a adubação com boro na cana pode proporcionar incrementos na produtividade e na qualidade da cultura. Conheça, a seguir, qual a importância do boro na cana e como fazer o manejo desse micronutriente na lavoura!
Qual a função do boro na cana-de-açúcar?
O boro está entre os principais micronutrientes que podem gerar um efeito muito positivo na produtividade e qualidade da cana-de-açúcar.
Estudos indicam que esse micronutriente pode proporcionar não somente o aumento do perfilhamento das touceiras, mas também aumentar a quantidade de açúcares totais recuperáveis (ATR), que são extraídos durante a produção de etanol e açúcar.
No artigo Effect of Micronutrients Soil Supplementation on Sugarcane in Different Production Environments: Cane Plant Cycle, Estevão Vicari Mellis e outros pesquisadores analisaram conjuntamente canaviais de 11 locais do Estado de São Paulo.
Eles observaram que a aplicação de boro no sulco de plantio foi significativa para o perfilhamento e produtividade da cana, quando comparado ao tratamento controle utilizado no estudo.
Parte desse resultado pode ser atribuído à participação do boro na formação da parede celular e na estrutura dos vasos condutores, sendo capaz de formar um polissacarídeo complexo péctico conhecido como complexo borato ramnogalacturonano II (RG-II).
O boro também é capaz de regular a fluidez da membrana, uma propriedade muito importante que garante o bom funcionamento das proteínas transportadoras de moléculas e receptoras de sinais.
O boro é um micronutriente que desempenha funções indispensáveis nas plantas, sendo importante para a produtividade e qualidade em várias culturas, como a cana-de-açúcar.
Outros estudos também indicam que a presença de boro nas plantas é essencial para inibir a formação de calose, um polissacarídeo semelhante à celulose que pode obstruir a principal via de transporte da sacarose nas plantas: o floema.
Além disso, o boro é capaz de facilitar o transporte de açúcares a longas distâncias, através da formação de um complexo açúcar-borato, que é ionizável e mais facilmente transportado através das membranas celulares do que as moléculas não boratadas e não ionizáveis.
Essa função, além de favorecer a produtividade de diversas culturas que dependem mais ativamente desse transporte, como a cana-de-açúcar, também é capaz de minimizar o ataque de pragas e doenças nas plantas.
Dessa maneira, o papel do boro no transporte de açúcares e na inibição da formação da calose podem proporcionar o aumento do ATR da cana-de-açúcar e, assim, ter um efeito positivo no acúmulo de sacarose nos colmos.
É o que explicam os pesquisadores Renato Passos Brandão e José Renato Otávio, no artigo Importância do magnésio e boro na produtividade e no ATR da cana
Então, como é possível fazer o bom manejo desse micronutriente no campo?
Como usar o boro na cana?
Um dos primeiros aspectos que devem ser considerados para realizar o manejo do boro na cana, assim como em outras culturas, é entender mais sobre como se dá a acumulação desse micronutriente ao longo do ciclo da cultura.
Para a cana-soca, por exemplo, estudos tem observado um padrão de acumulação progressivo, sendo mais lento durante os três primeiros meses de desenvolvimento e alcançando um acúmulo máximo de 116,4 g/ha, com maior distribuição nas folhas.
É o que observaram Marcos Rengel e outros pesquisadores, no artigo Crecimiento y dinámica de acumulación de nutrientes en caña de azúcar. II. Micronutrientes.
Padrão de acumulação de boro nos colmos e folhas da variedade de cana de açúcar var. RB 85-5035. (Fonte: Rengel et al, 2011)
Por isso, recomenda-se o uso de fontes de boro de liberação progressiva e com longo efeito residual, para que o fornecimento de boro para o canavial se dê de forma mais eficiente.
Essas duas características presentes em alguns fertilizantes são capazes de prolongar todos os benefícios que a fonte de nutrientes pode proporcionar a longo prazo, ao ajustar a liberação dos nutrientes às necessidades das plantas ao longo do seu ciclo.
Além disso, essas fontes ajudam a reduzir as perdas de nutrientes no sistema solo-planta-atmosfera, o que é muito benéfico para a disponibilidade de boro.
Isso acontece uma vez que esse micronutriente é altamente móvel no solo e pode ser facilmente carregado para as camadas mais profundas do solo.
Outro benefício das fontes de boro de liberação progressiva é que elas reduzem um dos grandes riscos da adubação com boro para as plantas: a toxidez pela superdosagem.
Fertilizantes muito solúveis em água, como o ácido bórico, podem facilmente elevar temporariamente os teores desse micronutriente no solo para acima dos níveis adequados.
Tal efeito se dá porque, especialmente no caso do boro, existe um limiar muito tênue entre os teores ideais e aqueles que podem causar sintomas de toxicidade para as plantas.
Já a médio e longo prazo, a aplicação desses tipos de fertilizantes pode provocar um efeito oposto e levar as plantas a expressarem sintomas de deficiência de boro na cana, como:
- Folhas imaturas enrugadas, quebradiças e com aparência “torcida e amarrada”;
- Lesões translúcidas ou em forma de “sacos de água” entre as nervuras;
- Manchas amarelas estriadas nas folhas mais novas;
- Redução comprimento e superfície das raízes;
- Aumento da incidência de doenças;
- Morte do meristema apical.
Por isso, muitos pesquisadores da área, como Patrick H. Brown e os demais autores do livro Boron in Plant Biology, reforçam a importância de evitar flutuações na disponibilidade de boro no solo para que não sejam causados efeitos adversos no crescimento e na produtividade das culturas.
Requisito esse que pode ser alcançando, por exemplo, ao substituir parcialmente ou totalmente as fontes de boro convencionais por fontes multinutrientes de liberação progressiva e com longo efeito residual.
O manejo eficiente do boro na cana deve sempre incluir a escolha criteriosa dos fertilizantes
Dessa forma, podemos perceber que o manejo eficiente do boro na cana depende do bom entendimento do padrão de acumulação desse micronutriente ao longo do ciclo da cultura.
Para isso, é importante que o agricultor sempre busque o máximo de informações acerca da variedade cultivada, a fim de entender qual a fonte de boro que melhor vai atender as necessidades nutricionais do seu canavial!