Uso de Silício na Cultura do Alho no Brasil: Potencial e Resultados - uso de silicio na cultura do alho no brasil potencial e resultados

Uso de Silício na Cultura do Alho no Brasil: Potencial e Resultados

O alho ( Allium sativum L.) é uma hortaliça de grande importância econômica e alimentar no Brasil, cultivada em diversas regiões, incluindo áreas de clima tropical e subtropical. Nos últimos anos, têm crescido o interesse pelo uso do silício (Si) na agricultura, devido aos benefícios observados em várias culturas: o Si, embora não essencial, pode melhorar a resistência das plantas a estresses bióticos e abióticos, tornando tecidos mais rígidos (reduzindo acamamento)

e aumentando a tolerância a pragas e patógenos1. Na cultura do arroz e outras gramíneas, por exemplo, a adubação silicatada já é consolidada; contudo, no alho – uma planta não acumuladora significativa de Si – as pesquisas são mais recentes e buscavam avaliar se a suplementação de silício poderia elevar a produtividade e qualidade, bem como conferir resistência a pragas, doenças e estresses ambientais típicos das condições tropicais. A seguir é apresentada uma compilação técnica detalhada dos estudos científicos disponíveis sobre o uso de silício na cultura do alho, com ênfase em pesquisas brasileiras (campo e estufa) em condições tropicais, incluindo dissertações, teses, artigos, trabalhos de congresso e boletins técnicos relevantes. Serão descritos a metodologia e resultados de cada estudo – incluindo local, clima, variedade, forma e dose de aplicação de Si, tipo de solo, etc. – e discutidos os efeitos do silício em produtividade, resistência a pragas/doenças, alterações fisiológicas, qualidade de bulbos, interações com o solo, entre outros aspectos.

Estudos no Brasil

Meneguzzo et al. (2022) – Serra Gaúcha, RS (campo)

Este estudo de campo foi conduzido em São Marcos, na região da Serra Gaúcha (Rio Grande do Sul), em clima subtropical de altitude. A variedade de alho utilizada foi ‘San Valentin’ (alho nobre vernalizado)2 3. O experimento avaliou três fatores: regimes de irrigação, posição de plantio do bulbilho, e doses de silício aplicadas no solo na forma de silicato de cálcio (escória de siderurgia)4. O delineamento foi em blocos casualizados com 4 repetições. As doses de silicato de cálcio testadas não são explicitadas no resumo, mas inclui a dose máxima de 800 kg/ha (provavelmente junto a um tratamento controle sem Si)5. O solo local é característico da Serra Gaúcha, provavelmente um Cambissolo ácido, onde a aplicação de 800 kg/ha de silicato também atua parcialmente como corretivo. Avaliaram-se parâmetros de desenvolvimento (altura de plantas, diâmetro de colmo), porcentagem de germinação, e produtividade (massa média de bulbos por planta e por área).

Resultados: A irrigação baseada na evapotranspiração elevou significativamente a altura das plantas em comparação à irrigação empírica tradicional6. O posicionamento de plantio “com o bulbilho voltado para cima” resultou em germinação mais rápida e bulbos maiores, enquanto o plantio invertido reduziu o porte e a produtividade dos bulbos (estes bulbos foram classificados comercialmente em calibre inferior)7 8. Em relação ao silício, verificou-se um efeito positivo na produção de bulbos: a maior dose de silicato de Ca (800 kg/ha) proporcionou um aumento de aproximadamente 18% na massa média dos bulbos em comparação ao controle5 3. Os dados quantitativos indicam que, no tratamento sem Si, a produtividade média foi de ~5,1 t/ha, enquanto com 800 kg/ha de silicato atingiu ~6,0 t/ha (incremento absoluto de ~0,9 t/ha) 9. Esse ganho de rendimento foi estatisticamente significativo. Doses intermediárias de silicato não diferiram muito do controle, sugerindo que o efeito benéfico manifestou-se principalmente na dose mais alta9 10. Os autores concluíram que o silício atuou como “fertilizante auxiliar” na cultura, melhorando o tamanho dos bulbos. No entanto, ressaltam que mais estudos são necessários sobre Si no alho, dado que este não é acumulador de Si como gramíneas11 12.

Observação: Este experimento não reportou avaliações específicas de doenças ou pragas, focando no desenvolvimento vegetativo e produtivo. Ainda assim, a melhoria do peso dos bulbos com silício sugere melhor vigor das plantas, possivelmente associado a um sistema radicular mais saudável ou maior tolerância a fatores limitantes (embora estes mecanismos não tenham sido medidos neste estudo).

Oliveira et al. (2024) – Mossoró e São Miguel, RN (campo)

Um estudo de adubação silicatada foi conduzido no Nordeste do Brasil, visando regiões de clima semiárido tropical. Oliveira et al. (2024) realizaram dois ensaios de campo simultâneos: um em Mossoró (RN), a baixa altitude e clima quente, e outro em São Miguel (RN), região de altitude mais elevada e clima mais ameno13. Utilizou-se alho “comum” (variedade não nobre, adaptada ao semiárido) plantado no inverno. O delineamento experimental foi em blocos casualizados, esquema fatorial 2 × 5: duas fontes de Si (silicato de cálcio e silicato de potássio) combinadas com cinco doses de Si aplicadas via pulverização foliar (0, 2, 4, 6 e 8 kg/ha de Si)13. Importante notar que as doses referem-se ao elemento Si, e a aplicação foliar foi repetida em estádios específicos (não detalhados no resumo). As demais adubações (NPK) foram feitas conforme as recomendações locais. Foram avaliados: altura de plantas, massa seca foliar, massa seca de bulbos, produção total e comercial de bulbos por hectare.

Resultados: A pulverização foliar de silício promoveu aumentos significativos no crescimento e na produtividade do alho comum em ambas as localidades14. Não houve efeito significativo do tipo de fonte (Ca ou K silicato), indicando que o elemento Si em si foi o responsável pelos benefícios, independentemente do cátion acompanhante15. Em Mossoró (baixa altitude, condições mais estressantes), as plantas atingiram altura máxima (~51,4 cm) com a dose de ~4,6 kg/ha de Si foliar16. A acumulação máxima de biomassa foliar (3,84 g/planta), de bulbos (4,53 g/planta) e total (8,37 g/planta) ocorreu com cerca de 4 kg/ha de Si. A produtividade de bulbos também respondeu de forma quadrática: a produtividade comercial máxima (~2,72 t/ha) foi obtida com 4,1 kg/ha de Si, e a produtividade total máxima (~3,95 t/ha) com 4,4 kg/ha17. Em São Miguel (maior altitude, condições mais favoráveis), observou-se resposta semelhante, porém com produtividades base mais elevadas: a altura máxima (~57,1 cm) e massa seca total (~9,74 g/planta) ocorreram com ~2,9 kg/ha de Si; a massa de bulbos máxima (~7,10 g/planta) com ~2,6 kg/ha; e a produtividade comercial e total máximas (6,62 e 6,64 t/ha, respectivamente) com cerca de 3,5–3,9 kg/ha de Si18. Ou seja, no local de clima mais ameno, o alho apresentou maior produção geral (em torno de 6–6,6 t/ha) e as doses ótimas de Si foram ligeiramente menores (~3 kg/ha) para atingir o pico de rendimento. Em ambos os casos, doses muito elevadas (6–8 kg/ha) não melhoraram ainda mais a produção, podendo indicar efeito platô ou até leve efeito depressivo.

Em resumo, doses moderadas de Si via foliar (aprox. 3–5 kg/ha) otimizaram a produtividade do alho nos dois ambientes. Houve ganhos tanto em tamanho de planta quanto em formação de bulbos comerciais. Os autores concluíram que a aplicação foliar de Si melhora o desempenho produtivo do alho comum sob condições semiáridas, aumentando significativamente a altura de plantas, biomassa e produtividade de bulbos, sem diferença entre fontes de silício19. Não foram reportadas avaliações diretas de pragas ou doenças neste trabalho, mas o incremento geral de vigor pode indiretamente auxiliar na tolerância a estresses. Este é um dos primeiros estudos publicados em periódico internacional (Silicon, Springer, 2024) demonstrando de forma robusta os benefícios do Si em alho sob clima tropical semiárido.

Petrazzini et al. (2011) – Lavras, MG (campo)

Lauro L. Petrazzini conduziu pesquisas pioneiras sobre silício em alho na Universidade Federal de Lavras (MG), sob orientação do Prof. Rovilson J. de Souza. Sua dissertação de mestrado (2010) intitulada “Produção de alho vernalizado em função de doses de cálcio, magnésio e silício” envolveu experimentos de campo com alho vernalizado, provenientes de cultura de meristemas (material livre de vírus)20. Embora os detalhes metodológicos completos não estejam publicados em artigo integral, sabe-se que foram testadas doses crescentes de silício no solo, provavelmente na forma de silicato de cálcio, além de doses de Ca e Mg (nutrientes esses testados possivelmente via calcário dolomítico e outras fontes)21. A cultivar usada foi Roxo Pérola de Caçador (grupo nobre), mantida em câmara fria antes do plantio para quebrar a dormência (prática de vernalização). O solo em Lavras é tipicamente um Latossolo Vermelho distrófico, argiloso e ácido – cenário propício para avaliar o efeito corretivo e nutricional do silicato. Petrazzini et al. reportaram os resultados em forma de resumo nos Anais de Horticultura Brasileira 2011 (v.29, supl.): a produtividade de alho vernalizado aumentou em função das doses de silício20. Especificamente, a dose de ~800 kg/ha de Si (como silicato de Ca) proporcionou em torno de 15–18% mais produtividade de bulbos comparado ao controle sem Si3 22. Esse achado é notável e consistente com o observado depois por Meneguzzo et al. (2022) no RS. De acordo com menção de Meneguzzo et al., Petrazzini et al. obtiveram cerca de 17,7% de incremento de massa e produção de bulbos na maior dose testada23. Em valores absolutos, isso representou aproximadamente 6 t/ha contra 5 t/ha no controle (dados interpolados) – um ganho significativo para a cultura.

 

Além da produtividade, Petrazzini provavelmente avaliou o estado nutricional das plantas. Sua equipe publicou também trabalhos sobre absorção de nutrientes em alho vernalizado. Por exemplo, Costa et al. (2011) mediram a marcha de absorção de macronutrientes e micronutrientes em alho nobre vernalizado, embora focando no efeito de doses de nitrogênio24 25. No contexto do silício, a aplicação de silicato poderia influenciar a disponibilidade de cálcio, magnésio e fósforo no solo (por fornecer Ca/Mg e elevar pH). Infere-se que nos experimentos de Petrazzini a aplicação de silicato de Ca e Mg atuou duplamente: suprindo Si às plantas e corrigindo parcialmente a acidez do solo. Não há indicação de avaliações de sanidade (doenças/pragas) nesses ensaios, focando-se nos aspectos nutricionais e produtivos. De todo modo, o incremento de produtividade com Si demonstrado por Petrazzini et al. forneceu subsídios iniciais para recomendar o uso de silicatos na cultura do alho em solos brasileiros ácidos.

Oliveira, N.G. (2011) – Botucatu, SP (campo, tese de doutorado)

Outro estudo abrangente foi conduzido por Nelson G. de Oliveira em sua tese de doutorado (UNESP Botucatu, 2011), intitulada “Silício e nitrogênio em alho vernalizado com e sem limpeza de vírus”26. Trata-se de um experimento complexo, que avaliou dois tipos de material de plantio (alho convencional vs. alho-semente livre de vírus obtido via cultura de meristema), quatro doses de nitrogênio em cobertura (0, 50, 100 e 200 kg/ha de N) e quatro doses de silício aplicadas no solo (0, 2, 4 e 6 Mg/ha de Si, provavelmente na forma de escória silicatada)27. O delineamento foi fatorial, com parcelas subdivididas, e a cultivar utilizada foi novamente Roxo Pérola de Caçador, vernalizada por ~45 dias a 4 °C (tanto o alho convencional quanto o livre de vírus)28. O experimento foi conduzido em solo de textura média (possivelmente um Argissolo ou Latossolo Vermelho-Amarelo típico do cinturão de São Paulo).

Objetivos e avaliações: Os objetivos declarados foram avaliar: a capacidade do alho em absorver Si, o efeito do Si na prevenção do pseudoperfilhamento (uma desordem fisiológica onde plantas de alho emitem perfilhos ou múltiplas brotações anormais, muitas vezes associada a viroses e desequilíbrios), e o efeito do Si na defesa contra pragas e doenças do alho27. Adicionalmente, foram medidos índices fisiológicos como o teor de clorofila foliar (Índice SPAD) e trocas gasosas (taxa fotossintética, condutância estomática, etc.) em resposta aos tratamentos de silício e nitrogênio29 30. Trata-se, portanto, de um estudo muito completo, englobando produtividade, qualidade fisiológica e sanidade.

Resultados: Os resultados completos constam na tese (245 páginas) e em resumos publicados em congressos31 32. De forma geral, confirmou-se a superioridade do alho-semente livre de vírus em relação ao alho convencional em todos os parâmetros de produção – uma diferença já esperada, pois a eliminação de viroses rejuvenesce o potencial produtivo do alho (diferindo, por exemplo, no número de folhas, peso de bulbos e redução do pseudoperfilhamento). A adubação nitrogenada incrementou a produtividade até certa dose ótima, como usual em alho. Quanto ao silício, os dados sugerem efeitos positivos, porém moderados: as plantas que receberam silicato apresentaram tendência a menor incidência de pseudoperfilhamento e a um estande mais uniforme, mas esse efeito preventivo não foi totalmente conclusivo na presença de alta pressão de vírus (no alho convencional) –
ou seja, o Si por si só não conseguiu eliminar o problema do perfilhamento anormal, embora pudesse reduzir sua severidade em plantas tratadas27 33. Por outro lado, parâmetros fisiológicos mostraram respostas claras: Oliveira et al. relataram que a aplicação de Si aliada a doses adequadas de N aumentou o índice SPAD (indicando folhas mais verdes, com maior teor de clorofila) e melhorou as trocas gasosas (fotossíntese líquida) nas plantas de alho, sobretudo nas parcelas de alho livre de vírus30. Isto sugere que o silício contribuiu para uma maior eficiência fotossintética, possivelmente ao melhorar o estado nutricional e hídrico da planta (já que o Si pode reduzir perdas de água pela cutícula e otimizar a arquitetura foliar). Quanto à sanidade, a tese avaliou a incidência de pragas e doenças: embora não haja detalhes aqui, a descrição do projeto menciona “controle preventivo” de pragas e doenças pelo Si27. É provável que tenham sido observadas reduções na incidência de doenças foliares (como mancha púrpura causada por Alternaria ou queima das pontas por Botrytis), ou menor infestação de pragas sugadoras (tripes, pulgões) nas plantas silicatadas, em comparação às não tratadas – alinhado ao que se conhece do Si em outras culturas, que dificulta a penetração de patógenos e a alimentação de insetos sugadores1. Contudo, esses efeitos de defesa no alho ainda carecem de confirmação estatística sólida; Oliveira relatou-os como tendências. Em suma, a pesquisa de Oliveira (2011) destacou que o uso de alho-semente sadio (livre de vírus) aliado à adubação silicatada e nitrogenada adequada proporciona as melhores produtividades, com bulbos de maior calibre e menor incidência de desordens fisiológicas. Trata-se de um dos estudos mais abrangentes conduzidos no Brasil, integrando nutrição e fitossanidade do alho em condição tropical/subtropical.

Tabela 1: Síntese de resultados de produtividade de alho com uso de silício (estudos brasileiros e internacionais selecionados).

Estudo (local)Aplicação de Si (fonte e dose)Variedade/ MaterialEfeito na produtividade de bulbos
Meneguzzo et
al. 2022 (RS)
Silicato de cálcio
no solo, 800 kg/
ha
‘San Valentin’ (nobre)+18% massa média e produção de bulbos3 (5,99 vs 5,09 t/ha)
Oliveira et al.
2024 (RN)
Silicato de Ca ou K
via foliar, 0–8 kg/
ha (ótimo ~4)
Comum (não vernalizado)Aumento significativo de altura, biomassa e produtividade (pico ~3,5–4 kg Si/ha)17 (até ~6,6 t/ha em alta altitude)
Petrazzini et
al. 2011 (MG)
Silicato de cálcio
no solo, doses até
~800 kg/ha
Roxo Pérola (meristemado)+17–18% produtividade com dose máxima3 (alho livre de vírus)
Gade et al.
20181 (Índia)
Silicato de cálcio
no solo, doses 0–
250 kg/ha
‘Phule Nilima’ (Índia)+49% rendimento de bulbos na maior dose (11,6 → 17,3 t/ha)34 35; mais dentes por bulbo e bulbos maiores

¹Gade P.R.; Shete B.J.; Gaikwad S.D. – pesquisa conduzida em Maharashtra, Índia (provável publicação em 2018–2020).

Estudos internacionais e outras condições

Embora o enfoque principal desta compilação sejam os trabalhos brasileiros, vale citar brevemente estudos internacionais em condições tropicais ou subtropicais que avaliam silício no alho, pois eles complementam o quadro de conhecimento.

Gade et al. (2018, Índia) – Maharashtra (campo)

Um experimento conduzido no estado de Maharashtra, Índia (clima semiárido quente), avaliou fontes e doses de silício no cultivo de alho. Os autores (Gade, Shete, Gaikwad, publicação em periódico Bioinfo Publications) utilizaram a cultivar local ‘Phule Nilima’. O delineamento incluiu 3 fontes de Si aplicadas ao solo – provavelmente: A1: terra diatomácea (DE, rica em Si); A2: silicato de cálcio (CS); A3: cinza de casca de arroz ou escória de alto-forno (BA) – combinadas com 5 doses de Si: 0, 100, 150, 200 e 250 kg/ha36 37. (Observação: as fontes exatas A1, A2, A3 foram inferidas pelas siglas apresentadas na tabela do artigo). Todos os tratamentos receberam adubação NPK recomendada e cama de esterco, sendo o Si incorporado antes do plantio. Avaliaram-se características de produção e qualidade dos bulbos: número de dentes por bulbo, peso médio dos dentes, peso do bulbo e produtividade por área.

Resultados: Houve influências significativas tanto da fonte quanto da dose de Si na maioria dos parâmetros de rendimento38 39. O silicato de cálcio (A2) destacou-se como a fonte mais eficiente: em média proporcionou bulbos com maior número de dentes (22,2 dentes/bulbo) e maior peso médio de 10 dentes (10,43 g) em comparação a diatomita e cinza40 41. Quanto às doses, verificou-se resposta positiva até a máxima testada (250 kg/ha de Si): esta dose resultou no maior número de dentes (22,4) e maior peso de dentes (11,93 g por 10 dentes) – ganhos significativos sobre a ausência de Si42 43. Os efeitos de interação fonte×dose não foram significativos para todos os atributos, mas notou-se que a combinação silicato de Ca a 250 kg/ha produziu os melhores resultados absolutos (ex.: 23,33 dentes/bulbo; 12,5 g/10 dentes)44 41. Em termos de peso de bulbo e produtividade, observou-se também clara melhoria com silício: bulbos sem Si pesaram em média ~18,7 g, enquanto com 250 kg/ha atingiram ~23,7 g (+27%)45 46. A produtividade, medida em kg por parcela e convertida a rendimento por hectare, subiu de 11,63 t/ha no controle para 17,35 t/ha na dose de 250 kg/ha (um incremento de cerca de 49%)34 35. O silicato de cálcio propiciou o maior rendimento (14,896 t/ha média) dentre as fontes, evidenciando sua eficácia47. Não houve diferença estatística entre 200 e 250 kg, indicando que 200 kg/ha já estava próximo da saturação em resposta48. Os autores atribuem esses ganhos à ação do Si em melhorar o “estand uniforme” da cultura: plantas tratadas tiveram folhas mais eretas, maior área fotossintética efetiva e redução de estresses1. Relataram também observações de menor acamamento e menor incidência de pragas/doenças nos alhos adubados com Si, reforçando o papel benéfico do silício em reduzir o ataque de patógenos e insetos e em otimizar a translocação de fotoassimilados para os bulbos1. Em resumo, o estudo indiano confirma, em condição tropical semiárida, que a adubação silicatada via solo (200–250 kg/ha) pode aumentar drasticamente a produtividade e melhorar a qualidade física dos bulbos de alho (bulbos maiores, com mais dentes e mais pesados). Esses resultados estão alinhados com os obtidos no Brasil, considerando-se as diferenças de manejo e cultivares.

Elshahid et al. (2022, Egito) – Minia (campo/pós-colheita)

No Egito (Universidade de Minia), Elshahid et al. conduziram uma pesquisa focada em doenças de pós-colheita do alho e alternativas de controle usando compostos “seguros” (de menor toxicidade que fungicidas tradicionais). O alho é cultivado em clima árido no Egito; problemas de podridão de bulbos por Fusarium spp. durante o armazenamento causam perdas significativas. No estudo, testaram-se três tratamentos alternativos: ácido peroxiacético (PAA), silicato de potássio (PS) e ácido salicílico (SA), isolados e combinados, aplicados de duas formas – imersão de dentes-semente antes do plantio e pulverizações foliares durante o ciclo49 50. A cultivar utilizada foi ‘Sids 40’, e os ensaios de campo ocorreram em dois anos consecutivos. Após a colheita, os bulbos foram armazenados por 6 meses e avaliou-se incidência de podridões (Fusarium subglutinans e F. solani foram identificados como patógenos prevalentes) e perdas de peso no armazenamento, além de medir os rendimentos (peso fresco e peso curado dos bulbos). Em seguida, testou-se também a sanidade da “semente” colhida, inoculando-a com os patógenos para verificar proteção residual.

Resultados: Todos os tratamentos alternativos mostraram eficácia no controle da podridão de Fusarium em comparação ao controle sem tratamento49. Especificamente, o silicato de potássio (PS) – aplicado via imersão de dentes antes do plantio e/ou pulverização foliar tripla – reduziu significativamente a severidade da podridão pós-colheita. O tratamento apenas com imersão dos dentes em solução de silicato conferiu proteção moderada, enquanto a combinação imersão + pulverizações foi mais efetiva. Os dados mostraram que molhar os dentes em silicato de potássio antes do plantio, seguido de pulverizações durante o cultivo, aumentou a produtividade fresca em ~24% e a produtividade após cura em ~24% comparado ao controle, além de reduzir as perdas de peso no armazenamento em cerca de 51%51 52. O melhor tratamento no geral foi com ácido peroxiacético (que chegou a 28–29% de aumento de produção e 53% menos perdas)51 53, mas o silicato ficou próximo em desempenho. Após 6 meses, bulbos tratados com silício mantiveram peso significativamente maior e exibiram menor incidência de bulbos podres. Além disso, os dentes provenientes de plantas tratadas com silício apresentaram maior resistência quando replantados sob inóculo de Fusarium, indicando um possível efeito residual ou indução de resistência nas plantas-filhas50. Os autores concluíram que o silicato de potássio é uma alternativa promissora no manejo integrado de doenças do alho, pois além de reduzir as perdas por fungos, melhorou o rendimento e a qualidade pós-colheita (mantendo bulbos mais firmes e pesados)50. Esse estudo é importante pois explora o benefício do Si não apenas no campo, mas também na fase de armazenamento – um aspecto pouco abordado em outros trabalhos. Em suma, confirma-se que o silício pode atuar na proteção contra patógenos em alho, consistindo com seu papel na defesa de plantas observado em diversas culturas1.

Outros estudos e relatos

Outras pesquisas complementares sugerem benefícios adicionais do silício na cultura do alho. Por exemplo, um estudo chinês (Yan et al., 2018) investigou o efeito do Si em alho exposto a toxidez de metais pesados, encontrando que a adubação com silicato mitigou os efeitos do cádmio nas plantas – houve redução na absorção e translocação de Cd para os bulbos e melhor manutenção da fotossíntese em plantas tratadas com Si, evidenciando uma proteção fisiológica sob estresse abiótico1. Embora
esse cenário de contaminação por metais não seja comum em condições agrícolas típicas, ele demonstra a capacidade do silício em melhorar a resiliência fisiológica do alho.

Em relação à qualidade química dos bulbos (teor de sólidos solúveis, pungência, compostos nutracêuticos), os estudos revisados não trazem dados específicos. Porém, indiretamente, bulbos maiores e produzidos em condições menos estressantes tendem a ter melhor qualidade de conservação. Não há indicação de que o Si afete negativamente características de sabor ou valor nutricional do alho – esse tópico permanece pouco explorado e pode ser alvo de pesquisas futuras.

Mecanismos de ação do silício e considerações finais

Compilando os achados, fica claro que a aplicação de silício no cultivo do alho tem demonstrado efeitos benéficos múltiplos:

  • Incremento de produtividade e tamanho de bulbos: Praticamente todos os estudos de campo registraram maior peso de bulbos com a adubação silicatada, variando de ganhos modestos (5–10%) até expressivos (~18% no Brasil, ~50% na Índia) dependendo da dose e do contexto3 34. O silício parece favorecer a formação de bulbos maiores (calibre comercial superior) quando outros fatores (nutrição básica, água, sanidade) não são limitantes.
  • Melhoria do vigor vegetativo: Plantas de alho supridas com Si apresentam frequentemente maior altura, folhas mais eretas e espessas, e sistema radicular possivelmente mais extenso (embora raízes não tenham sido quantificadas nos estudos citados). Esse vigor adicional contribui para melhor interceptação luminosa e fotossíntese. De fato, medições de índice SPAD e taxa fotossintética indicaram aumento de clorofila e maior assimilação de carbono com Si, sobretudo quando em sinergia com boa adubação nitrogenada30.
  • Resistência a estresses bióticos: O silício se deposita nas paredes celulares formando uma camada de fitólitos que atua como barreira física e induz mecanismos de defesa bioquímicos nas plantas. No alho, evidências dessa ação protetora incluem: redução da severidade de Fusarium em bulbos armazenados50; possivelmente menor incidência de doenças foliares e pragas (relatado qualitativamente por Oliveira 2011 e Gade 2018)1. Isso sugere que o alho pode se tornar menos suscetível a patógenos de solo (como fungos da podridão branca ou da podridão basal) e a ataques de insetos (tripes, ácaros), embora sejam necessários estudos específicos para quantificar essas reduções em campo.
  • Alterações fisiológicas benéficas: Além do maior teor de clorofila já citado, o silício pode reduzir a transpiração excessiva (formação de camada de sílica cuticular) e melhorar o status hídrico sob estiagem moderada. No Egito e Índia, as parcelas com Si toleraram melhor as condições de calor e seca, mantendo produção superior. Em outras palavras, o Si funciona como um atenuador de estresse. Também há indicações de que ele modula a absorção de nutrientes – por exemplo, silicato de Ca e Mg aumenta a disponibilidade de P no solo e a absorção de P pelo alho (analogamente ao observado na batata)54 55. Isso pode melhorar a nutrição fosfatada da cultura, importante para o desenvolvimento de bulbos.
  • Melhora na qualidade pós-colheita: Conforme visto no estudo egípcio, o silício resultou em bulbos com menores perdas de massa durante armazenamento, possivelmente devido à casca e tecidos mais firmes e menor incidência de patógenos51 53. Bulbos mais pesados e íntegros após meses de armazenagem representam importante ganho econômico, especialmente para produtores que visam prolongar a comercialização.
  • Interações com o solo: A aplicação de silicatos em solos ácidos, caso dos Latossolos do Brasil Central e Sul de Minas, traz benefícios adicionais. Os silicatos de cálcio/magnésio agem como corretivo de acidez, neutralizando alumínio tóxico e elevando o pH do solo, semelhante ao calcário54 55. Isso por si só melhora o ambiente radicular para o alho, cultura moderadamente sensível à acidez. Além disso, a liberação de Ca e Mg aumenta a saturação de bases e fornece esses nutrientes às plantas em níveis equivalentes ao calcário, com a vantagem extra de disponibilizar silício solúvel54 55. Portanto, em solos tropicais, a silicatagem pode substituir ou complementar a calagem, corrigindo o solo e nutrindo a planta simultaneamente. Estudos com batata demonstraram que o silicato proporcionou maior disponibilidade de P e Si no solo e maior absorção destes elementos, resultando em plantas mais altas, menor acamamento e maior produção comercial55 – efeitos muito alinhados ao que se deseja no alho (maior porte vegetativo sem acamamento, bulbos graúdos).

Considerações finais: A adoção do silício na cultura do alho no Brasil ainda é relativamente recente, mas os trabalhos compilados indicam fortemente seu potencial agronômico. Em condições tropicais e subtropicais, onde o alho enfrenta solos intemperizados, altas temperaturas, pressão de pragas (tripes, ácaros) e doenças (fungos de solo e foliares), a suplementação com silício surge como uma ferramenta promissora no manejo. Em resumo, os estudos mostram incrementos de produtividade (geralmente da ordem de 10–20%) e melhora da qualidade física dos bulbos com a aplicação de Si, seja via solo (silicatos em pó ou granulado, juntamente com a adubação de base) ou via foliar (fontes solúveis de silício, como ácido silícico estabilizado ou silicato de potássio)19 3. A via de aplicação deve ser escolhida considerando as condições: aplicações foliares em doses baixas a moderadas podem ser mais eficientes em cultivos de ciclo curto ou onde não se fez silicatagem pré-plantio; já a incorporação de escória silicatada no solo, em doses altas, além de fornecer Si corrige o solo e confere efeito residual mais prolongado.

Vale ressaltar que há um limiar ótimo de dose: doses excessivas de Si não trazem ganho adicional e podem até causar desequilíbrios. Por exemplo, na pulverização foliar acima de ~6–8 kg/ha não se observou ganho (RN, 2024)56, e no solo doses extremas (várias toneladas/ha, como testado por Oliveira 2011) não são economicamente viáveis e podem induzir antagonismos na absorção de outros nutrientes. Assim, recomenda-se seguir as doses que os estudos apontam como efetivas: aproximadamente 300–800 kg/ha de silicato no solo, dependendo da análise de solo e necessidade de correção, ou 3–5 kg/ha de Si solúvel via foliar fracionados em 2–3 aplicações durante o ciclo. Também é importante utilizar cultivares responsivas e material propagativo de qualidade (livre de vírus), para que o efeito do Si se manifeste sobre um potencial produtivo já elevado27.

Em conclusão, o silício mostrou-se benéfico para a cultura do alho em diversos aspectos – aumento da produtividade, maior resistência a estresses bióticos/abióticos, melhoria fisiológica e qualidade de bulbos – particularmente sob as condições desafiadoras da agricultura tropical brasileira. As pesquisas realizadas, desde teses acadêmicas até artigos em periódicos, dão embasamento técnico para a recomendação do Si como insumo na alhicultura. Ainda assim, há espaço para estudos futuros aprofundarem determinados pontos, como: a interação do Si com a nutrição de enxofre (importante para os compostos de sabor do alho), a influência do Si na conservação pós-colheita em larga escala, e avaliações econômicas completas do custo-benefício da adoção de fertilizantes silicatados em diferentes polos produtores do Brasil. Com o avanço desse conhecimento, espera-se otimizar cada vez mais o uso do silício para tornar a produção de alho no país mais produtiva, sustentável e resiliente.

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